Na Estefânia. Na rotunda. E as memórias de infância. As idas regulares ao hospital ao longo de anos. A médica que me dava sempre uma folha e lápis de cor. Que antes de perguntar aquilo que era esperado, queria saber as notas da escola, e os passatempos, e os passeios. A médica que perguntou aos meus pais o que andavam a fazer para que os sintomas estivessem a desaparecer. E que, antes de escutar qualquer resposta, como quem não quer saber, se limitou a dizer “continuem a fazê-lo”.
Anos largos mais tarde, a mesma rotunda que nos levava aos Capuchos. As visitas diárias ao hospital para te ver. A espera à porta da única unidade completamente isolada. O cheiro quando se entrava. Os frascos coloridos pendurados íntimos de momentos cinzentos. Quase negros.
Mas, na Estefânia, na esquina com a Avenida Casal Ribeiro, também há cores quentes, cheiros reconfortantes, complexos, familiares. Memórias de muitos jantares felizes. O nome Zaafran é inspirado na especiaria exótica, com uma cozinha de inspiração indiana. Caseira. Muito caseira. A ementa é reflexo de uma viagem cujo destino final é Lisboa. Dizem os guias e os críticos que o restaurante Zaaafran não pretende ser um restaurante de comida de fusão mas antes um local que reflecte a fusão vivida pelas pessoas que o fazem. Nós preferimos dizer que é o restaurante do tio Bob e a cozinha da tia. Literalmente. Somos fãs do caril de gambas mas pedimos invariavelmente o menu de degustação que repetimos até à exaustão. O tio Bob vem sempre à mesa. À nossa e à de todos. Ensina e volta a ensinar, conta uma história e conta mais outra. E aprendemos com ele a melhor forma de comer chamussas. À maneira dele.
A decoração minimalista com pequenos detalhes inspirados na Índia, consegue torná-lo num espaço intimista e acolhedor. Nada Bollywoodesco, muito sofisticado.
É onde vamos comer quando, desejosos de picante, não queremos dar trabalho à Kuri (ou à mãe, ou à sogra). Não dando trabalho à Kuri, vamos dar trabalho ao tio. Em jantares de amigos ou a dois. É, mesmo, um dos nossos destinos predilectos em Lisboa. E sim, levamos sempre a Maria. Mas a Maria come indiano desde que tem um ano. Por isso, em relação a miúdos, deixo nas vossas mãos. Mas fica o conselho: experimentem. Não se vão arrepender.
(Fotos: Zaafran)
(mais um artigo meu no eu, mãe)