Eu, Tu e os meus sapatos

Louca pela vida. Louca por ti. Louca por escrever. Louca por sapatos.

É como a gravidade.

Às vezes gostava de me desligar, deixar de acompanhar, não ajudar e ignorar, deixar de ler e, sobretudo, deixar de sentir o que sinto, essa estranha e genuína sensação de “saber o que é isso”, de uma verdadeira e infeliz cumplicidade. Apagar essa malfadada empatia.

Gostava de não sentir o cheiro da morte. Gostava de não reconhecer sintomas, números e palavras escutadas. Gostava de não repetir a angústia do por quê e para quê tamanho sofrimento para chegar a esse final que deixa aqueles que cá ficam desesperados, com vontade de contrariar a gravidade.

Mas sei, porque já o vivi, que fechar os olhos, desligar, ignorar e não sentir, não faz sentido. Seria ignorar uma realidade muito real e que pode ser a lotaria de qualquer um de nós ou dos nossos.

Poderíamos dizer que é mórbido, de loucos, quiçá masoquista, no extremo louvável, como já ouvi, eu digo apenas que é a minha faceta usurpadora… conviver diariamente com estas vidas, mais do que relembrar-me a dor que vivi (que não precisa ser relembrada e que não deixa nunca de ser vivida), mantém-me agarrada à realidade, relembra-me a todos os instantes a efemeridade da vida, não me deixa esquecer aquilo em que acredito, não me deixa dizer “vai-se andando”.

Obriga-me a viver.

Obriga-me a ser feliz.

10 Discussions on
“É como a gravidade.”
  • É por isto e por muito mais que gosto de te ler, por me identificar com esta ideia de que a vida não é para se ir levando, é para viver, hoje, aqui! Independentemente das dificuldades e dores que vão aparecendo na vida…
    E é isso, a palavra viver diz tudo. Sê feliz, muito!

  • Fabuloso este post. Adoro a tua força de viver e o teu positivismo por detrás de todos os cenários negros. infelizmente tenho tendência para o negativismo, mas penso que as perdas que vivi têm de facto de me lembrar para ser feliz. Porque o sou.
    Obrigada

  • Me,
    Acompanho o seu blog há bastante tempo… Li este texto, e porque já vivi e senti o que escreve, deixe que lhe diga que está Fantástico, transparente e único. Reflecte emoções e sentimentos que quanto a mim são únicos de quem os vive, até porque “o essencial é invisivel aos olhos”
    Continue assim!!

  • Senti um arrepio ao ler este texto. Já tive de viver de perto um processo de doença prolongada de um familiar (o meu pai). O que começou com um tumor nos intestinos complicou-se em todas as suas possibilidades e como ele já era doente crónico de diabetes em 2 anos e meio passou de um homem normal, que fazia a sua vida toda, a ser totalmente dependente de terceiros para todas as actividades do seu dia-a-dia. Foram-lhe amputadas ambas as pernas e ficou numa cadeira de rodas. Custa-me muito lembrar tudo o que passou, ele e nós que nada podíamos fazer, mas também me agarro a isso para perceber que temos de nos agarrar à vida e viver sem apenas “ir andando”.

  • A tua forma de viver é e será sempre uma inspiração, muitas vezes dizes que muitos não te entendem… eu entendo porque me parece que tive uma educação semelhante à tua e os meus pais têm a mesma força e forma de viver. Quando leio este texto não posso evitar ficar triste mas, apenas por um instante porque tal como tu acredito que desligar nunca é a solução e são estas coisas que nos obrigam a viver e a ser feliz.

    Um beijo grande querida

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